LÁ FORA

 

FOTO: IGARAPÉ DO PASSARINHO. 2020. AUTOR: CUCUNACA, 2020.

Por: Mauro Bechman*


Lá fora, o Lobo sonda e olha a minha casa com o fito ameaçador das feras

Lá fora, por detrás das frágeis grades de alumínio, o indeterminado assobia em brisa fria

Lá fora, há medo e escuridão enquanto as portas cerradas dos meus alegres vizinhos, comunicam medo

Lá fora, nem o chão de cimento precário é confiável

Lá fora, o caminho do igarapé, vazio, cinza e coberto de mato verde e sombrio

Lá fora não há vida


Minha casa, meu castelo,

Que rei sol eu?

Na janela, o que se fez nesse tempo de simulacro do sangue do cordeiro

Casa fechada, mas quente pelas luzes internas

A menina da meia porta da casa de madeira, na cama, doente

Meu caçula noutro cômodo, sem forças não consegue sentir o cheiro do aroma amarelo dos ipês

O primogênito, enclausurado em sua sabedoria e inocência diante da vida

Que rei sou eu?


Um frio me toma de assalto, me enfraquece e vai me demolindo

Calafrios de Stalingrado 44 meu corpo em transe

Sem sono, a insônia e o desespero bailam diante de mim

Minhas costas em dores insuportáveis não me permitem o repouso reparador

Não sei a quem pedir ajuda.

São 04h da madrugada. Pensei em gritar pelos vizinhos, mas não havia vizinhos.

Lembrei do meu Herói, a quilômetros de mim.

Tentei o retorno proposto por Joaquim Nabuco, o apelo a mãe e o grito não vingou


Então, abri meu peito e pedi a Deus.

Senhor! estou só. Envia teus anjos. Protege a minha casa pois meu pai está longe e não tenho ninguém.

Precariamente embrulhado deito e meu corpo deságua, suor enquanto tento manter a consciência

De repente, olho para a entrada da casa, na frente da porta, vejo Anjos empurrando algo para fora

fechando a entrada, só vejo suas asas brancas, numa força empurrando algo e impedindo o que estava lá fora, entrar na casa.

Eu disse a mim mesmo, não quero nem ver o que está acontecendo lá fora, apenas deitado rezarei.


E assim, muito suado, e era tanto suor, que encharcou onde estava deitado. E adormeci.

Pela manhã, ao despertar lembrei da luta que foi a madrugada

E a menina da janela relatou que no sono viu Nossa Senhora de Fátima enquanto doente dormia


Na consciência e lucidez, lembrei que existem demônios e anjos também nesta vida de grande provação

Há um Deus que rege a minha e a nossa vida e  a Ele levantarei cantos sendo eternamente grato pela Vida.

Fracos eu e minha pequena família fomos lentamente recuperando as forças.

Pela Graça de Nosso Deus, o Deus da Vida.

E sobre um novo caminhar, apenas posso dizer: Eis-me aqui Senhor!


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*Meu relato sobre o Sars-Cov-2 que fui acometido de dezembro a janeiro de 2020-2021.

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